sábado, 28 de fevereiro de 2009

conto ou não conto?

Eu moro numa torre alta, todos os dias de manhã me salvo dos monstros imaginários e desço todos os quinhentos e quarenta degraus depois de trançar meu próprio cabelo, atravesso a selva de pedra, vou à luta, contra dragões e bruxas, mato alguns leões às vezes, mas tem dias que é dia da caça. Acredito em princípes e desencantos, mas simpatizo mais o estilo Shrek que o encantado, por causa do quanto de realidade ele traz, pois em tempos de ficção isso vale muito. Tenho um espelho maluco que as vezes me diz que sou bela, mas ele mente também. E é assim como filme baseado em história real, esse conto que escrevo e que por isso vos previno, é capaz de ter final feliz porque prefiro assim.

Dolorido

A professora observa o menino cruzar a sala várias vezes pegando um lápis de cor de cada vez, da mesa da colega, emprestado.
-Gabriel você esqueceu seus lápis de cor?
-Não professora, eu não tenho. Minha mãe não comprou, ela não tem dinheiro. (Disse isso com a franqueza maior do mundo, sem receio, sem vergonha, só verdade.)
Não havia mais nada que a professora pudesse dizer.

Proposta


BRISA

Vamos viver no Nordeste, Anarina.
Deixarei aqui meus amigos, meus livros, minhas riquezas; minha vergonha.
Deixarás aqui tua filha, tua avó, teu marido, teu amante.
Aqui faz muito calor.
No Nordeste faz calor também.
Mas lá tem brisa:
Vamos viver de brisa, Anarina.

Manuel Bandeira, Estrela da Vida Inteira (Nova Fronteira pg.191)

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

a terrinha


Cidadezinha qualquer
casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.
Eta vida besta, meu Deus.
Carlos Drummond de Andrade


minha cidadezinha qualquer inesquecível... (foto antiga, paisagem recente)

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Love, love, love...


Mais um tesouro que tenho in MA.
Amor Bastante
Quando eu vi você
tive uma idéia brilhante
foi como se eu olhasse
de dentro de um diamante
e meu olho ganhasse
mil faces num só instante
(...)
Paulo Leminski

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Bêbado

Essa garrafa cheia de mim mesmo,
onde mato minha sede,
contém o álcool destilado do mundo.
Imagens e palavras me embreagam,
Me consumo em doses duplas,
sem gelo, me bebo e mato meu vício solitário,
Afogo os pensamentos no balcão
desse butiquim que sou.

Rafael Monteiro*

*amigo virtual que me manda essas coisas bonitas.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Passageiro

"Definitivo

Definitivo, como tudo o que é simples.
Nossa dor não advém das coisas vividas,
mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram.
(...)
A dor é inevitável.
O sofrimento é opcional. "

Carlos Drummond de Andrade (valeu Rafa!)
Por incrível que pareça, antes de receber o email com o texto com o trecho acima, estava pensando em escrever algo sobre essa mania de achar que só o que nos faz feliz é aquilo que ainda não temos, porque parece que é exatamente isso. Houve um tempo em que coloquei minha felicidade numa bicicleta e muito tempo depois quando eu deveria ter a felicidade, aquilo era só um objeto sem importância alguma. Não é horrível que façamos isso com pessoas? Depositarmos em alguém nossa felicidade, além de contraditório (pra ser leve), não faz o menor sentido. E apesar disso ser de fácil compreensão, inacreditavelmente é o tipo de coisa que fazemos, sabendo que vai dar errado, mas mesmo assim fazemos. E sofremos. Então pelo jeito é inevitável, mas podemos aprender tudo, e também a ser, a sentir, a viver. Assumindo a fala da primeira pessoa, Eu preciso aprender mais de tudo isso, mas sem deixar de sonhar um pouco, porque não dá pra viver só de razões todo tempo, eu penso. Nem de certezas (que pena), nem coerência, e por isso essas linhas aqui. Tortas, tristes e melancólicas quando o que eu queria mesmo era copiar esse poema do Carpinejar, daqui ->(http://poucascoisasmuitas.blogspot.com/) . Porque muito do que eu rascunho nesse blog aqui, vem na mente, nas viagens diárias dentro do bus, tentando chegar em mim. Mas quando eu estou bem perto de chegar, vejo que estou um tanto perdida. Isso não é bom e, nem o fato de às vezes pensar que serei mais feliz quando tiver um carro.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Ensinamento

Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado."
Arrumou pão e café, deixou o tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.
Teresa

A primeira vez que vi Teresa
Acheia que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.
Eu poderia só colocar os dois poemas acima, para serem lidos e apreciados, mas eu preciso dizer que os considero perfeitos, lindos. Me impressiona a forma delicada de arranjar as palavras e falar de uma maneira simples mas, excepcionalmente singela, emocionante. Eu não acho os melhores adjetivos pra dizer o quanto gostei, mais eu gostei muito.